sábado, 9 de setembro de 2017

Os olhos são janelas da alma...





Dois completos estranhos entrecruzam seus olhares, e foi só o que bastou. Não havia como imaginar tamanha ligação que aconteceria, mas foram só, apenas olhares, aquele momento inconsciente e aquele choque percorrendo o corpo, mas tudo se apaga, e voltam para o mundo real, já fora do campo de visão.

Quem é ele?

Quem é ela?

O que aconteceu?

Perguntas ficam soltas no ar...

Mas agora é tarde... Ambos já seguiram sua vida, sua rotina. Mas a vida é esperta, ela sabe o que preparar e como fazer. O que se passou ali não foi mero acaso, algo vai acontecer...
O dia corre como de costume. Ele vai ao trabalho, almoça, volta para casa, mas ela não sai de seu pensamento... Os olhos... ele não esqueceria aqueles olhos...

Em casa, ele toma seu banho, come um lanche e checa seus e-mails. Recebe alguns convites de redes sociais e não tendo o que fazer, além da pensar na mulher desconhecida, verifica as solicitações. Em um grupo, ele nota uma mulher semelhante àquela. Ela residia muito longe, em outro estado. Mesmo acreditando não ser ela, achou que valeria a pena mandar-lhe um convite de amizade, algo lhe havia chamado atenção. Então o fez.

Ela levou um susto ao receber o convite do homem que com quem havia cruzado mais cedo. Como ele a achou? Um pouco assustada, ela decide deixar pendente a resposta. Tentar encontrar algo sobre ele na internet, mas nada... O estranho é que ela sentia uma curiosidade imensa, ela olhava para a imagem, a fotografia dele na tela e algo a puxava, havia um magnetismo, como pela manhã, quando trocaram olhares. Então ela percebeu que seu local de residência ainda permanecia inalterado, que estava como se ela residisse em outro estado, então só teria que tomar cuidado para não se cruzaram tão cedo novamente. Respirou fundo e aceitou o convite.  Agora era esperar para ver.

Logo estavam trocando muitos segredos, conversavam como se fossem velhos conhecidos, e aquela ligação entre eles parecia aumentar. Mas mesmo com tudo isso, ela não lhe contava que morava a poucos minutos dele.

 No entanto, as coisas aos poucos foram mudando, eles estavam muito próximos, e ela sonhava com todas as histórias de encontros que eles criavam juntos a distancia. Ela precisava se afastar ou assumir que estava mentindo para ele. Não sabia o que iria machucar mais: ela o deixar, não falar mais com ele ou ver a mágoa que ele lhe devolveria ao saber da mentira. Ela acreditou que a saudade doeria menos, e assim o excluiu de suas redes e bloqueou suas mensagens no e-mail. Para ele, ela havia sumido, como se nunca tivesse existido, ela se apagou na rede...

Ele ficou sem chão, achando que tudo não passou de delírios dele, loucuras... Não havia mais nada, nada que confirmasse que ela existia, a não ser a única foto que ele havia salvado em seu computador, do perfil dela, logo no começo da relação. E só isso...
Dias passaram, semanas, e nada... Ele não a encontrava em nenhuma rede, seus e-mails retornavam, e ninguém sabia lhe dizer nada sobre ela. Mas ele não desistiria.

Todos os dias ele vasculhava as ruas e fazia uma promessa silenciosa: se a encontrasse ela novamente, ele não nem perguntaria, pegá-la-ia pelo braço e arrastá-la-ia para qualquer lugar onde pudessem ficar a sós, mesmo arriscando a levar uns tapas ou ser perseguido pela polícia, se ela gritasse por socorro. Essas imagens lhe causavam uma confusão de sentimentos: era tensão, tesão, adrelina... Tudo junto. Todos os dias ele pedia em orações que a encontrasse, e pedia coragem para fazer o que prometia.
Ela se cuidava ao máximo. Havia cruzado por ele umas duas vezes, mesmo trocando de trajeto, aconteciam os encontros. A sorte era que ela o via antes, e agora usava óculos escuros, aproveitava o verão e assim encobria boa parte de seu rosto, mas principalmente, não deixava seus olhos a denunciarem.

No momento em que ela o via, seu coração disparava, e ela precisava lutar contra si para se mover, para não correr ao encontro dele. Quando ficava sozinha em casa, chorava a sua dor da saudade... Ele era perfeito, tudo o que ela desejava em um homem ele possuía, por isso mesmo ela acreditava que ele não a perdoaria.
Ela começou a enlouquecer com aquela situação, ela o desejava... E só agora entendia que precisava dele, mas era tarde demais... Não o via há mais de uma semana, ia antes do horário para a praça que ele cruzava todos os dias, sentava e lá ficava a procurar. Ela estava de férias, então pegava um livro, um chapéu, seus óculos e se sentava num banco. Mas nada, nem um sinal, assim como ela havia sumido do mundo virtual, ele sumiu do real.

Dias se passaram e suas férias já estavam acabando, e logo ela teria que voltar a trabalhar, e nem um sinal dele. Mesmo assim, ela ia todos os dias ler na praça...

Ele estava incrivelmente intrigado com a mulher que sempre estava lendo na praça nas duas últimas semanas. De manhã, o trânsito no centro era terrível, com muito congestionamento, então ficava alguns minutos observando-a.

Sentia que ela fazia o mesmo: observar. Mas parecia mais, ela dava a impressão de estar procurando alguém... E essa sensação lhe causava um aperto no peito, como se significasse algo profundo para ele. Aquela sensação que ele não tinha há meses, desde que sua amada sumiu, sem deixar esperanças para ele.

À noite, em sua cama, escutando rádio, tocou uma música especial:” Hoje a noite não tem luar” (Renato Russo/Legião Urbana), era uma das músicas que ela amava, que era especial, ela dizia que sempre se sentia sendo tocada no íntimo do seu ser ao escutar a letra...
A letra era como uma facada em seu peito:
E hoje a noite não tem luar, E eu estou sem ela, Já não sei onde procurar
Não sei onde ela está...”
E como num flash de memória ele lembrou de uma frase que ela havia escrito em uma das suas primeiras conversas online: “Se você quiser me achar pela rua, procure a mulher com um livro na mão e com fones no ouvido”.

Só podia ser ela na praça!

Aquela noite parecia não passar, as horas se arrastavam. Ainda era muito cedo quando ele estacionou seu carro num lugar próximo ao banco em que a mulher se sentava todos os dias. Uma hora se passou até a avistar. Ele usava calças jeans, uma camiseta mais solta, presa por um cinto bem leve, carregava só seu livro nas mãos e estava com fones, discretos, visível apenas porque o fio era branco, o que o destacava no azul da blusa.

O coração acelerou, não tinha certeza se era, não conseguia ver os olhos, nem o rosto... Porcaria de chapéu... e por que não estava nublado hoje?! Respirou fundo, saiu do carro, permaneceu ali parado ainda alguns minutos, reunindo coragem para fazer o que estivera prometendo há muito tempo para si mesmo.

Ela nem esperança tinha mais de encontrá-lo, ia até a praça pelo simples prazer de ler, e porque não conseguia ficar em sua casa, sozinha... Acomodou-se em seu banco preferido. O dia estava fresco, não tinha um sol tão intenso, então ela tirou seu chapéu, colocou ao seu lado e pôs seus óculos junto. Sem nem olhar ao seu redor, pois nada dali lhe interessava, além dos ruídos da cidade que lhe tirava o aperto da solidão, mesmo que temporariamente, iniciou sua leitura.
Enquanto ela realizava suas ações sem pensar, ele analisava cada movimento, e a cada segundo tendo a certeza que era ela. Sem dúvidas, direcionou-se até o banco.

Parou em frente dela. Ela ergueu os olhos para criticar quem quer que fosse que estava ali, atrapalhando seu momento de paz... Mas qualquer ação se perdeu quando seus olhos se encontraram. Ele não disse uma palavra sequer, apenas a puxou para si e lhe deu um beijo intenso, de puro desejo, luxuria.

Não dando atenção para nada do que havia ali, apenas a puxou consigo, indo em direção ao seu carro. Abriu a porta do passageiro, lhe indicou que entrasse, bateu a porta, deu a volta e embarcou também.

Nenhuma palavra trocada, nenhuma ação... Ele apenas dirigia, sem rumo ainda... E ela observava a estrada a frente. E assim foi por vários momentos, até ele parar em uma rua paralela, que circundava uma linda lagoa. Desceu e foi caminhando até a margem. Não sabia o que pensar, o que fazer... Havia pensando tanto naquilo e agora nada... Estava em choque.

Ela permaneceu no carro, buscava coragem. Sabia que agora não tinha volta, eles estavam sozinhos, era a hora da verdade... E a dor que ela sentiu ao imaginar perdê-lo novamente foi esmagadora, mas era o certo a fazer.

Saiu do veículo e caminhou na direção dele com passos leves e demorados. Ele olhava o horizonte, não a viu até ela estar ao seu lado. Ela pegou sua mão. Ele não hesitou. E assim permaneceram mais alguns segundos. Até a realidade cair sobre eles. Eles se olharam, um olhar verdadeiro, de encontro de almas. Daquela forma que palavra nenhuma consegue descrever. Quando o inconsciente fala mais que qualquer ação. A única pergunta: Por quê? A única resposta nesse momento: Medo...Sem mais nenhuma palavra, dita ou pensada, eles se entregaram de corpo e de alma para aquele magnetismo que eles sentiram desde seu primeiro olhar cruzado...E foi ali, na beira da lagoa qe colocaram de lado todas as dores, medos e angústias e finalmente tiveram seu momento, nada havia além deles no mundo.

A única coisa que ouviram ao fundo (vindo não se sabe de onde) foi a melodia da música que agora era integrante dos dois, com um significado misteriosamente encaixado em suas vidas... “Tenho certeza que não sonhava, A noite linda continuava, E a voz tão doce que me falava, O mundo pertence a nós”.

Luana Jenifer

Imagem: Samuel Marcondes Fotografias

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