Quando eu era
criança, nossa família vivia num sítio. Década de 1930 a 1950, em Gramado. Em
1930, meus pais e irmãos mais velhos foram extrativistas, isto é, tiravam da
terra o que a natureza lhes dera até então. Caminhões e mais caminhões levavam
a madeira e os xaxins que havia em profusão. Para as vacas leiteiras e cavalos
foi feita uma invernada. Eles se alimentavam das gramas e pequenos arbustos e
inços entre as árvores altas.
A partir de 1940,
como colonos, ajudados por peões, plantavam-se muitos tipos de plantas, como:
milho, batatas, pessegueiros, macieiras, pereiras, laranjeiras, amoras,
framboesas, vimes. Estas plantações, além de pasto para vacas, cavalos, porcos,
galináceos davam o sustento à família e empregados.
Minhas irmãs e eu,
por sermos meninas, o que dificultava o trabalho pesado da lavoura, “fomos
saídas” para parentes de cidades para estudar e ter futuramente uma profissão.
Assim, tornei-me
professora. Durante muitos anos, poucas vezes retornei ao lar, apenas para
curtir férias.
As pessoas da
família foram desaparecendo como por encanto. Faleciam. Leis vieram. A
estrutura do sítio mudou. Não mais havia família como antes, nem empregados.
Um dia, lá pelos
anos de 2010, andando pelas terras, vi uma infinidade de jovens araucárias,
copadas, mais altas que eu. Algumas em linha reta. Como surgiram ali?
Minha irmã, ao meu
lado, que morou com nossos pais por mais tempo que eu, respondeu:
- Lá pelos anos de
1980, mais ou menos, nossa mãe quis reflorestar. Plantou estas árvores. Ela foi
esperta. Sabia que as araucárias são frágeis no desenvolvimento, por isso colocou os pinhões ao lado dos moirões
(postes) das cercas da invernada. Assim, o gado não pisaria os brotos e as
árvores poderiam crescer.
Isto foi o que
realmente aconteceu. Lágrimas vieram aos meus olhos. Imaginei minha mãe, aos 75
anos, colocando aqueles pinhões no lado de cada moirão ao redor da invernada.
Alguns não vingaram, claro, mas uma infinidade de pinheiros, agora com 30 anos,
parece que agradecem o gesto anônimo de uma velhinha que lhes deu a vida.
Liti Belinha Rheinheimer
Imagem: Instituto
Chico Mendes